Uma reportagem investigativa veiculada pela ESPN denunciou irregularidades seríssimas, que envolvem os governos estadual e municipal do Rio de Janeiro, o governo federal e o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). O "Dossiê Maracanã", elaborados pelos combativos e militantes jornalistas Lúcio de Castro e Gabriela Moreira, revelou que a obra no estádio é ilegal, pois trata-se de uma construção tombada, que foi escandalosamente alterada, sem seguir os tramites legais.
O responsável por essa aberração foi o sr. Carlos Fernando de Souza Leão Andrade, que é funcionário do Estado do Rio de Janeiro, mas na época (2011) ocupava o cargo federal de superintendente do IPHAN. Quando autorizou a demolição da marquise e das arquibancadas tombadas, o ex-superintendente, que é arquiteto, tinha matricula na Secretaria de Obras do Rio de Janeiro, órgão estadual interessado e beneficiado com essa autorização. Um escandaloso e flagrante conflito de interesse! Hoje, esse funcionário ocupa um cargo comissionado em outra secretaria e recebe um salário de 10 mil reais.
Além do conflito de interesse, passível de críticas e investigação, essa decisão de autorizar a demolição de um patrimônio histórico e artístico nacional é eminentemente ilegal, pois é fruto de uma atitude arbitrária e unilateral. Para se ter uma ideia do absurdo, essa autorização foi concedida sem o conhecimento do Conselho Consultivo do próprio IPHAN. Quanto a isso, vale muito a pena ler a ata de reunião desse conselho, publicada na integra pela reportagem (Dossiê Maracanã). Esse documento revela a indignação da esmagadora maioria dos conselheiros, que mostram-se verdadeiramente estarrecidos com esse "modus operante".
Maracanã depois das demolições ilegais que alteraram a
marquise (cobertura) e as arquibancadas do estádio.
De acordo com a legislação, somente a Presidência da República possui prerrogativas para autorizar alterações dessa natureza, que representa um destombamento do estádio, um ato privativo do presidente do país. O Ministério Público Federal interpôs recurso jurídico, mas a Justiça Federal, atendendo ao governo do Rio, concedeu uma liminar autorizando o prosseguimento das obras. A questão ainda está na justiça, aguardando decisão final. As áreas tombadas, por sua vez, foram demolidas e o estádio já está praticamente terminado. O argumento é o mesmo: não podemos esperar, não podemos perder tempo, pois temos que atender as exigências da FIFA. E dane-se a nossa história, nossa cultura, nosso patrimônio, nossa memória!
Diante disso, muitas explicações precisam ser fornecidas a sociedade brasileira. Primeiramente, Dilma, a presidenta, tem obrigação de se pronunciar sobre esse caso, afinal, essa autorização de destombamento (demolição de um patrimônio histórico e artístico) cabia somente a presidência. Se ficar calada, estará sendo cúmplice ou no mínimo omissa com essa ilegalidade, que feriu, inclusive, uma prerrogativa que lhe pertencia. Quem também deve muitas explicações é o governo do Rio de Janeiro: como um funcionário estadual ocupou um cargo federal que lhe permitiu conceder essa autorização ilegal? Isso não demonstra um conflito de interesse? Se essa autorização era ilegal, porque o governo do Rio aceitou esse documento? Por que entrou na justiça para respaldá-la? Tudo isso precisa ser explicado, pois a nota que o governo estadual divulgou hoje é muito pouco esclarecedora.
Da mesma maneira, o IPHAN precisa se pronunciar. Como o sr. Carlos Fernando (arquiteto/ funcionário do Estado do Rio) chegou a superintendência desse órgão? Como a sua autorização ilegal não passou pelo conhecimento do Conselho Consultivo da entidade? A Justiça Federal também deve algumas explicações: se a suposta autorização era ilegal, por que concederam liminar ao governo do Rio?
O caso é grave, por isso pode muito bem ser considerado mais um dos muitos escândalos dessa Copa do Mundo. Infelizmente, como estamos no Brasil, não creio que seja levado a sério. Tenho certeza que os responsáveis não serão penalizados. Na verdade, os mesmos nem se darão o trabalho de explicar nada! Em nosso país, o poder público age assim. Para atender seus interesses, o sistema passa por cima de tudo e de todos. Nem a legalidade é capaz de pará-los! Nosso passado, então, é totalmente desconsiderado, não tem o mínimo valor, pois, sem nenhum tipo de pudor, é apagado para atender interesses privados que não contemplam as expectativas, nem tão pouco as necessidades e os interesses do povo brasileiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário