quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Futebol com Maconha - o Puxa Firme F. C. de Stanislaw Ponte Preta


Stanislaw Ponte Preta é, na verdade, o pseudônimo do jornalista e escritor carioca Sérgio Porto, que nasceu em 1923 e morreu em 1968. Iniciou sua carreira jornalistica em 1949, depois de ter trabalhado como bancário durante 15 anos. Começou escrevendo para a revista Sombra, mas posteriormente também colaborou com jornais como a Última Hora e o Diário Carioca, onde passou a utilizar o pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta. Apesar de sugestivo, o pseudônimo escolhido não guarda nenhuma relação com o clube da Ponte Preta, time de futebol de Campinas.
Sérgio Porto, na verdade, inspirou-se em Serafim Ponte Grande, personagem satírico criado por Oswald de Andrade. O pseudônimo era utilizado, sobretudo, para ironizar os cronistas sociais de sua época, que para o escritor assumiam uma importância nem um pouco merecida. Ao longo de sua carreira, escreveu para uma série de revistas e jornais importantes, tendo trabalhado ainda em diversas emissoras de rádio e televisão. Simultaneamente, dedicou-se a atividades artísticas, produzindo críticas ou desenvolvendo trabalhos na área da música, teatro ou literatura.
Foi trabalhando nos jornais e nas rádios que começou a desenvolver sua faceta de comentarista e cronista esportivo. Suas crônicas e comentários carregavam a marca da ironia e do bom humor, que misturava-se a uma linguagem que era ao mesmo tempo pomposa, coloquial, descontraída e irreverente. Tudo isso fez com que desenvolvesse um estilo bastante particular, mesclando a crônica humorística à criação literária.

Sérgio ou Stanislaw trabalhando em sua "intimorata Remington",
 como chamava sua máquina de escrever.

Mas para Sérgio Porto, o futebol estava longe de representar apenas um tema para suas crônicas e comentários esportivos. Desde muito jovem praticava esportes. Chegou a integrar, inclusive, em 1944, a equipe de voleibol do Fluminense, seu time do coração. O futebol sempre foi uma de suas maiores paixões. Como nunca foi muito habilidoso, jogava de goleiro nas peladas que batia com os amigos no Rio de Janeiro. Desde a infância, jogava em qualquer lugar: campos de terra, grama e areia, passando, inclusive, pelos campinhos de futebol de botão.
No entanto, apesar da paixão pelo esporte, sua maior contribuição no futebol foi mesmo no campo da literatura esportiva. Grande parte desse legado foram reunidos em livros como Bola na Rede: a Batalha do Bi e Gol de Padre e Outras Crônicas, entre outras coletâneas, que publicaram alguns dos seus melhores textos sobre o esporte. Logo abaixo, reproduzimos uma das crônicas de Sérgio Porto ou Stanislaw Ponte Preta. O título é bastante peculiar, diria que para alguns também não deixa de ser bastante sugestivo. A crônica, intitulada Futebol com Maconha, narra a história de um jogo muito divertido e engraçado entre o Puxa Firme F. C. e o time do padre Evaldo. Vale a pena ler... confiram!

Coletânea de textos em que foi publicado a 
crônica destacada na postagem.


Futebol com Maconha

Tem cara que é tricolor, tem cara que é vascaíno; uns torcem pelo Flamengo, outros pelo Botafogo. Mas, Primo Altamirando tinha que ser diferente: o miserável me confessou noutro dia que é torcedor do Puxa Firme F. C., Sociedade Recreativa do Morro do Queimado. Aliás, essa história foi ele que me contou.
Diz que dos 22 jogadores, mais técnico, massagista, enfermeiro do Puxa Firme, não tem um que não seja apreciador da erva maldita. O preparo físico do time se resume numa rápida concentração, para puxar maconha. Em véspera de jogo a janela da sede, que fica no sobrado de um botequim, parece até incêndio: como sai fumaça! No sábado passado, o técnico do time - um tremendo crioulo que atende pelo vulgo de Macarrão - deu o grito:
__ Olha cambada, amanhã nós tem que jogar comportado. Nós vai enfrentar o time do padre Evaldo e é em benefício da igreja.
Como Macarrão é muito respeitado ninguém chiou e no dia seguinte, no telheiro do campo, que a turma apelidou de vestiário, o time uniformizado contava com: Dentinho, Macaxeira, Bom Cabelo, Pau Preto e Lamparina; Melodia e Fubecada; Chaminé, Praga de Mãe, Porém e Parecido (tudo apelido, inclusive Parecido, porque fazia um sorriso igual ao do senhor Juraci Magalhães - político baiano - sempre que acertava um). Macarrão deu as instruções e perguntou:
__ Argum problema?
Lamparina levantou o dedo e perguntou:
__ Que tipo de marcação que a gente vai usar?
Macarrão pegou um papel de embrulho e deu uma de técnico formado. Traçou uns riscos e disse:
__ Marquemo por zona. É mais melhor.
O time saiu pro campo e com cinco minutos a turma do padre já tava dando de goleada. Macarrão berrava as instruções cheio de ódio. "Não intrapaia os beques, crioulo nojento". "Oia a marcação, desinfeliz". "Pára de fumar, Dentinho". E o time do padre fazendo gol.
Quando já tava uns cinco a zero, Porém fingiu que marcava, chegou perto do telheiro e quis saber de Macarrão se podia apelar.
__ Apela pra sua mãe, sem-vergonho. Tá levando come aí pra todo lado. Arrespeita o time do padre, que é tudo gente dereita.
Diz primo Altamirando que o Puxa Firme F. C. quando joga respeitando o adversário perde metade de sua estrutura técnica. O jogo acabou 8 x 0 e o piedoso sacerdote estava todo satisfeito, tendo mesmo se dado ao trabalho de ir cumprimentar o crioulo Macarrão, pela lisura com que seus atletas se comportaram durante a refrega.
__ Parabéns, senhor Macarrão - disse o padre. - Certas derrotas têm o gosto da vitória. Seu time jogou com muita esportividade. Só não entendi por que jogaram com dez.
__ Com dez??? - estranhou Macarrão. - Como é que eu não arreparei?
Foi aí que Melodia, que era o capitão do time, esclareceu?
__ Pois é, o Lamparina não jogou. O senhor foi falar aí em marcação por zona. Sabe como é o Lampa. Não pode ouvir falar em zona que ele vai pra lá.

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