sábado, 2 de março de 2013

Futebol e política. Uma homenagem aos 59 anos do Dr. Sócrates.

Entre os jogadores de futebol do Brasil e do mundo, não é comum o interesse por assuntos relacionados a política ou a cidadania. No caso específico do nosso país, esse desinteresse é perfeitamente compreensível, já que a esmagadora maioria dos nossos jogadores são de famílias humildes, que vivem em regiões periféricas, onde não são assegurados educação de qualidade, acesso a cultura e outros direitos básicos importantes na concretização da cidadania. No entanto, mesmo quando viram craques e passam a receber altos salários, tonando-se prestigiados perante o público e a mídia, os jogadores não se preocupam em investir no crescimento intelectual ou cultural, salvo uma ou outra exceção. Em tempos de estrelas com discursos e dancinhas vazias de sentido e ideologia, tais como Neymar, Ronaldinho Gaúcho e muitos outros, é fundamental lembrarmos de craques que tiveram uma posição contrária, destacando-se por assumir uma postura política combatente. O aniversário de Sócrates, que completaria 59 anos no último dia 19 de fevereiro, é uma ótima oportunidade para rememorarmos a memória desse fantástico jogador, diferenciado tanto pela técnica demonstrada nas quatro linhas quanto pela sua atuação política.
Filho de funcionário público federal, Sócrates nasceu em Belém, no Pará, em 1954, mas ainda criança mudou-se para Ribeirão Preto (SP), pois, por conta do trabalho, seu pai foi transferido para essa cidade. Quando criança jogava futebol na escola, mas na adolescência passou a treinar no Botafogo-SP, time bastante tradicional da cidade de Ribeirão Preto. Sócrates teve uma boa formação intelectual: estudou em boas escolas, teve orientação familiar e cresceu em um ambiente cercado por livros. Aos 17 anos ingressou no curso de medicina, mas não abandonou o futebol, pois continuou treinando e jogando no time juvenil do Botafogo-SP. Em 1973 decidiu se profissionalizar como jogador, mas manteve-se como estudante de medicina, terminando o curso em 1977. Sócrates já se destacava no time de Ribeirão Preto, mas preferiu concluir seu curso para depois transferir-se para um clube grande de projeção nacional. Isso ocorreu em 1978, ano em que o agora Dr. Sócrates foi contratado pelo Corinthians. No clube paulista, transformou-se rapidamente em ídolo, o que lhe permitiu chegar a seleção brasileira em 1979, quando foi convocado para disputar um amistoso contra o Paraguai.
A partir desse instante, o craque corintiano passou a ganhar o status de ídolo nacional, ao mesmo tempo em que começou a se destacar também pela sua atuação política. Na primeira metade da década de 1980,  marcada pela reabertura política, o doutor Sócrates liderou, junto com outros jogadores e com o apoio do vice-presidente do clube, o sociólogo uspiano Adílson Monteiro Alves, a Democracia Corintiana, um movimento único na história do futebol brasileiro. Durante esse momento, todas as decisões que envolviam a equipe eram tomadas coletivamente, pois os jogadores, os funcionários e a comissão técnica deliberavam juntos as questões de interesse coletivo, tendo todos direito a voz e voto. Diante das estruturas conservadoras e patriarcalistas do futebol, a Democracia Corintiana teve um papel fundamental em um contexto histórico importante na história do Brasil. Sob a liderança de Sócrates, um clube de massa com forte apelo popular iniciou um processo de abertura, tornando-se exemplo para a abertura política no nosso país. Sua atuação política combatente se fez presente também na campanha pelas Diretas Já. Em um histórico comício no Anhangabaú, Sócrates condicionou sua permanência no país à aprovação da emenda Dante de Oliveira.

Dia do Fico: em comício histórico no Vale do Anhangabaú (SP),
 Sócrates afirma para quase 2 milhões de pessoas que ficaria
 no Brasil se as diretas fossem aprovada.

Quando assumiu essa postura diante de quase 2 milhões de pessoas, o Doutor abriu mão de um contrato na Itália, recusando uma proposta do time do Roma. Infelizmente, a emenda foi rejeitada e o Dr. Sócrates, decepcionado, acabou mesmo indo embora do Brasil. Uma nova proposta da Itália levou o craque para Florença, onde atuou pela equipe da Fiorentina. Mas Sócrates não se adaptou, e depois de pouco mais de 1 ano, 33 jogos e apenas 9 gols, voltou ao Brasil. Em seu país, jogou ainda pelo Flamengo e o Santos, encerrando sua carreira em 1989 no Botafogo-SP, onde tudo começou em Ribeirão Preto. Até a sua morte, Sócrates manteve uma postura política combatente. Sua voz faz falta, principalmente, nos dias de hoje, marcado pela corrupção e pelo mal uso do dinheiro público, que caracterizam uma verdadeira farra, justificada pela realização da Copa do Mundo, um evento que está longe de deixar qualquer legado para o povo brasileiro. Como uma forma de homenagear o nosso Dr. Sócrates, reproduzimos uma entrevista feita pela revista Placar com o craque brasileiro. Realizada pelo jornalista Juca Kfouri, essa entrevista foi publicada em uma edição histórica da revista. Na capa da Placar, imprimiu-se uma fotografia de Sócrates caracterizado como Dom Pedro, acompanhada da seguinte frase do Doutor: "Se o Brasil mudar, eu fico". Acompanhe a entrevista e a matéria, intitulada "O dia do fico do rei corintiano".





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